...É lamentável e triste, dor
irreparável quando abrimos o jornal e uma manchete bem localizada nos dá a
notícia de que, num acidente, alguém perdeu um filho. Não existe dor maior. Só
quem tem filho pode imaginar o que isso significa. Perder um filho é como
perder metade de você, e o que é pior, a outra metade não aprende mais a viver...
...Temos conhecimento que viúvos
e viúvas significam que um do casal tenha partido. Quando se perde o pai ou a
mãe diz-se que os filhos ficaram órfãos. Mas para quem perdeu um filho nenhum
dicionário conseguiu ainda palavras para preencher o significado. Todas as
pessoas que tiveram a infelicidade de perder um filho e não importa com que
idade perdeu, não conseguiram se livrar desse complexo sofrimento que é seguir
a vida sem eles. Nenhum especialista tem dado com segurança suporte emocional
àqueles que o procuram tentando encontrar explicação para o tremendo espaço ocupado
pela angústia e pela falta de motivação. Quando partem os pais deixando filhos,
mesmo que menores, nos tem parecido que a ordem natural das coisas continua
sendo obedecida. A morte de um filho tira do chão os pés do pai e da mãe, que
flutuam pelo resto de seus dias. Ela produz uma ruptura na realidade daqueles
que perdem, porque a vida é abruptamente destroçada e não deveria ser assim.
Nenhum pai admite ter sido pai de um filho e de repente deixar de o ser.
Difícil se dar conta de que o filho já não está mais presente. Os pais passam a
resistir como podem, como conseguem, acreditando por um instante divino que seu
filho não se foi, passando a valer-se dessa negação
a fim de sentir que o filho continua vivo. É claro que depois de uma luta
interior incansável contra uma realidade inadmissível, o pai acaba cedendo e
admitindo a perda. É notório também, que a existência do filho fica inscrita
para sempre na mente paterna ou materna, pois se há de convir que um filho não
seja uma pessoa a quem se conheça de imediato, como ao restante dos outros. A
um filho se reserva um espaço todo especial na mente e no coração, desde que os
pais planejam a sua concepção e, a partir dela, toda a sua existência. Muitos
pais, ao se depararem com a morte de um filho, relatam que em várias ocasiões
tinham pensado: “eu planejava como deveria ser o batismo de minha filha,
chegava mesmo a imaginar cada uma das festas de aniversário que eu lhe faria,
mas nunca fui capaz de conceber como deveria ser seu funeral”...
...Parece-me que, ainda que se
escreva uma enciclopédia completa sobre a experiência de se perder um filho,
não seria suficiente para se chegar a compreender o que vivem esses pais.
Quando falam da solidão e de seus vazios, continua incompreensível para mim, porque
solidão e vazio são palavras difíceis que preenchem a lacuna da ausência. E
essa falta continuará a se fazer presente, servindo para vislumbrar a essência
humana e nos tornar conscientes de que, muitas vezes, “se não estamos dispostos
a encarar a morte, é porque o amor causa dor, e só quando se sofre é que se
sente medo de perder a pessoa amada”...
(Manoel Ruiz Filho)